Texto por Larissa Takahashi e fotos por Gabrielle Monteiro, voluntárias do projeto Comunicadores São Paulo (2019).


A Casa de Referência para Mulheres Helenira Preta é uma ocupação, na cidade de Mauá, no ABC Paulista, e uma de suas principais lutas é a defesa da vida das mulheres. “Todas nós da Casa Helenira Preta somos parte do Movimento de Mulheres Olga Benário”, explica Carolina Vigliar, uma das coordenadoras da Casa.

Com o objetivo de combater à violência contra a mulher, a Casa de Referência atua tanto no atendimento às vítimas, quanto na prevenção da violência de gênero. De acordo com a coordenação da Casa, a primeira ocupação aconteceu em 2017. “Ocupamos uma casa no centro de Mauá, mas era um prédio tombado, então houve o pedido de reintegração de posse”, afirma Carolina. “Mas nós conseguimos um canal de diálogo com a prefeitura”, completa. 

Porém, a instabilidade política, pela qual Mauá passa dificultou a negociação. “Nossos canais de comunicação foram interrompidos e por causa da demora de um novo local para o funcionamento da Casa, resolvemos novamente pela ocupação”. Atualmente a Casa Helenira funciona em um prédio abandonado de um antigo colégio. 

“Na verdade ocupamos primeiro a escola ao lado, essa nossa casa é acoplada a escola, aqui era onde ficavam os laboratórios e também a casa do caseiro”, explica Luiza Clara Marques Luiz, também do grupo de coordenação. De acordo com ela, o espaço físico do local ocupado era muito grande e, logo o grupo percebeu que não teria braços para arrumar o lugar e receber as mulheres, por esse motivo decidiram ficar apenas na casa menor, ao lado da escola. 

Uma das queixas da ocupação é a falta de água na casa. “A água que temos aqui é um projeto de TCC de uma aluna da UFABC, junto com um professor, ela fez um sistema de captação da água da chuva”, conta Luiza.   

Atualmente, a Casa Helenira conta com dez mulheres na coordenação e, apesar das dificuldades, calcula que já atendeu cerca de 70 mulheres. “Hoje, estamos com 5 mulheres atendidas, elas estão sendo acompanhadas pela psicóloga e pela advogada”.  

Elas explicam que o trabalho com essas mulheres vítimas de violência requer bastante paciência e carinho já que estão passando por um processo para conseguirem sair desse ciclo de violência. “Nós temos em mente que muita delas vêm para cá, mas acabam voltando para esse ciclo de violência. O processo para sair desse ciclo é muito longo e não é culpa delas, e nós temos que entender esse processo”, afirma Luiza.

Carolina também relata outras dificuldades para ajudar essas mulheres. “As delegacias não estão preparadas para atender mulheres vítimas de violência. Esses dias, acompanhamos uma mulher na delegacia com a advogada da casa e eles não queriam fazer o boletim de ocorrência porque ela era de outra cidade. Isso não está em lei nenhuma, quando conseguimos registrar o B.O, eles dificultaram a medida protetiva, e a mulher estava correndo risco de morte, no fim acabou dando tudo certo”, disse. “Agora imagina uma mulher que vai sozinha, sem saber de nada, está desesperada e chega à delegacia, com certeza ela vai sair de lá pior. Ela não é acolhida, não é orientada, ninguém explica o que tem que fazer. Não é fácil”, declara.

Luiza acrescenta outro fato corriqueiro nos atendimentos das delegacias. “Essas mulheres são obrigadas a repetir diversas vezes a história, ela é obrigada a reviver a história diversas vezes e sai de lá muito mais traumatizada”, garante. 

Além do atendimento a mulher vítima de violência, a Casa conta com outras atividades. “Temos Sarau, a ideia é ter bastante cultura, música, porque queremos nos divertir e, aqui é um lugar onde há troca de experiência. Muitas mulheres não sabem que são vítimas de violência, quando elas vêm para as atividades, para fazer algum curso, em um contato com outras mulheres elas acabam descobrindo que também são vítimas de violência”, explica Carolina. “Aqui também são dadas oficinas e cursos para que elas possam aprender algumas coisas para vender e se emancipar financeiramente”, garante.

Atualmente, a casa conta com uma psicóloga, uma advogada e uma assistente social. Luiza explica que toda ajuda é bem vinda. “Quem tiver alguma ideia de curso e quiser vim ministrar esse curso, tiver interesse em ajudar, é só aparecer”, orienta Luiza. Ela também explica que para quem quiser participar da coordenação da Casa basta participar das reuniões que acontecem todas as terças, a partir das 14h00. 

Movimento de Mulheres Olga Benário

Carolina conta que o Movimento de Mulheres Olga Benário se organiza em todo o Brasil e foi criado para unir mulheres na luta por melhores condições de vida e pela igualdade de direitos. “O movimento nasceu em 2011. Algumas brasileiras participaram de um encontro de mulheres na Venezuela, onde mulheres de outros movimentos, outras organizações tomaram a decisão de fundar o Movimento de Mulheres Olga Benário”, explica.

De acordo com ela, além das pautas já citadas, o movimento atua também na luta pela creche, lutas em universidades. “Fazemos outras coisas para além da Casa. Temos uma coordenação nacional, as coordenações estaduais, cada lugar toca sua luta, a gente se organiza por núcleos”, completa. 

Em São Paulo o movimento atua na capital, na USP, na Zona Leste, no Instituto Federal e no Centro. “No ABC nos organizamos em Santo André, São Bernardo, Mauá e estamos começando em Diadema”, finaliza. 

Parir não é parar

No dia em que a Atados visitou a Casa Helenira Preta, acontecia o Sarau Parir não é Parar. “O Parir não é Parar nasceu e 2014 como uma frase de afirmação minha, do meu movimento de pós-parto, logo depois que eu tive a minha filha, que hoje está com 5 anos. A frase surgiu da minha compreensão do que é a condição de mulher, mãe parida nesse sistema patriarcal e, junto com as minhas reflexões, eu fazia um movimento de sair para maternar com outras mulheres de modo alternativo”, explica Janaína Silva, uma das coordenadoras do coletivo. 

Completam a coordenação do Parir não é Parar, Lívia Loureiro, Natália Telles, Talita Araújo e Brisa De La Cordillera. 

Janaína conta que a ideia do grupo é tirar as mães do confinamento domiciliar que a maternidade impõe. “Queremos discutir a maternidade de uma perspectiva real, porque a primeira coisa que encontramos quando nos tornamos mães é a romantização da maternidade. Isso oprime a gente e dá continuidade a um sistema opressor para mulher”, afirma. 

Ela explica que para mudar esse cenário é preciso ocupar espaços públicos e privados para fortalecer o vínculo dessas mães. “Para isso, precisamos caminhar juntas. A maioria das mulheres do coletivo é artista. Esse é nosso segundo Sarau, e com ele queremos que as mulheres paridas saiam de casa para ocupar outros espaços, espaços seguros e acolhedores para as mulheres e suas crias”

Janaína também ressalta a importância de pessoas sem filhos entender e debater essa pauta. “Se uma pessoa sem filhos participa de um sarau e fica com a criança em uma presença respeitosa e verdadeira ela está cumprindo um papel social político de uma dimensão que ela nem sabe. Essa ajuda é uma presença que falta na vida das mulheres paridas, mesmo as que têm os seus companheiros em casa, porque nós ainda temos uma ideia de que a responsabilidade total da criança é da mãe”, finaliza.


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