Márcia Feliz, 47 anos, articuladora comunitária na Pró-Saber SP, em Paraisópolis (Foto: Isabel Praxedes/Comunicadores Atados)

“Uma escolinha no fundo do meu quintal” sempre foi o sonho de vida de Márcia Félix, 47 anos, e foi com muito esforço e com poucos recursos, que junto com sua irmã, a professora conseguiu montar atrás da sua casa um lugar para dar aula para crianças. “Nós trabalhávamos com as portas abertas, então todos da comunidade que quisessem conhecer o lugar eram muito bem-vindos”.

Conheça a história da Pró-Saber SP.

Naquela época, no começo dos anos 2000, sua escolinha tinha como foco a alfabetização das crianças. “Até então, eu só conhecia o método tradicional de alfabetizar: ensinar e passar lição”. Porém, em 2003, o braço direito de Márcia, que era sua irmã, ficou doente e acabou falecendo, tornando a ideia de manter a escola quase que impossível.

Crianças passam a tarde brincando no Pró-Saber SP (Foto: Isabel Praxedes/Comunicadores Atados)

Foi então que Márcia decidiu aceitar uma proposta que havia recebido um tempo antes e que permitiria com que ela continuasse ajudando as crianças da comunidade: trabalhar no Pró-Saber SP. “Um dia a Maria [fundadora do Pró-Saber SP] entrou na minha escolinha para saber algumas informações sobre a comunidade e a gente manteve o contato e logo depois que minha irmã faleceu, a Maria me chamou para ir trabalhar com ela”.

Para Maria Lins, fundadora da ONG em São Paulo, Márcia é considerada como um dos pilares estruturais do Pró:

“Márcia conhece cada família, cada dificuldade que cada uma passa, conhece com profundidade as carências e as potências da região. Ela é brilhante em aliar na sua fala firmeza com amorosidade. A Márcia é referência para todas as famílias e alunos daqui.”

Márcia se emociona ao falar de seu envolvimento com o Pró-Saber SP (Foto: Isabel Praxedes/Comunicadores Atados)

No Pró-Saber SP, Márcia começou como auxiliar de sala e aprendeu que existem diferentes modos de ensinar as crianças. Foi lá que descobriu a importância do brincar e que incentivar isso é fundamental para o desenvolvimento das crianças. “No começo foi difícil, o método deles era diferente do que eu conhecia”.

Moradora da comunidade de Paraisópolis desde sempre, Márcia conhece quase todo mundo da região e diz que é fácil saber quem não mora por ali. “Meus pais foram umas das primeiras pessoas a virem morar aqui na comunidade. Lembro que aqui era tão pequenininho”. Foi essa ligação forte com a comunidade que fez com que Márcia se tornasse mediadora entre o Pró-Saber SP e Paraisópolis.

Responsável pelo contato com as famílias, Márcia entrevista os pais das crianças que participam dos projetos e busca saber das necessidades e dificuldades dos alunos. “Meu trabalho é também mostrar que esses pais podem contar com a gente, que eles podem aparecer aqui e estar sempre em contato com a nossa equipe”.

Márcia é vista pelos colegas de trabalho como alguém com um propósito de acolhimento e escuta. “Ela tem uma escuta ativa, uma escuta que permite que as diferenças sejam vistas como complementares em nossas ações. Nas suas histórias, nas suas perguntas e no seu olhar reside um interesse verdadeiro pelo que o outro pensa e sente. Acredito que esse é o primeiro passo para qualquer processo de aprendizagem, o desejo de conhecer o outro”, relata Denise Nalini, coordenadora pedagógica.

Vista da janela do Pró-Saber SP, em Paraisópolis (Foto: Isabel Praxedes/Comunicadores Atados)

Uma das coisas que Márcia mais gosta dessa parte do seu trabalho é perceber como muitos pais se surpreendem ao entrar no Pró-Saber SP. “Eu abro aquela portinha e eles ficam encantados, querem conhecer todos os cantinhos. Eles ficam surpresos como é possível ter tanta coisa aqui”. Além disso, Márcia organiza bazares para o pessoal da comunidade na quadra do centro e é a ponte do Pró-Saber SP com outras ONG’s da comunidade e participa de diferentes reuniões e fóruns, como o Multientidades, que reúne as organizações para discutir os problemas e o dia-a-dia de Paraisópolis.

Ao ser perguntada sobre sua relação com as crianças, Márcia se desmancha, começa a sorrir e responde prontamente: “É tudo! Eu me dedico por elas, para dar carinho e amor”. Andando pelo Pró-Saber SP, Márcia mostra as doações arrumadas em diferentes caixas e fala do orgulho que sente de lá: “Eu já passei por tanta coisa, que eu acho que se eu não tivesse o Pró-Saber SP na minha vida eu já teria desabado”.

Um pouco depois daquela conversa, era a hora de entrada das crianças da tarde e Márcia foi para perto do portão para acompanhar. “Gosto de fazer todas as entradas e saídas para ver se estão todos vindo e como estão”. Enquanto as crianças entravam, Márcia sabia dizer o nome de cada um e ganhava um sorriso de quase todos que passavam por ela. “Nunca se sabe muito, sempre tem uma coisinha que a gente aprende e foi o Pró-Saber SP que me ensinou isso”.

Texto escrito pela voluntária Beatriz Atihe e fotos da voluntária Isabel Praxedes